Consciência de cidadania
“Em primeiro lugar, matemos todos os advogados”!
A Folha de São Paulo (11/05/2011) noticia que a Procuradoria Geral da República está movendo uma ação no Tribunal para conter supersalários de burocratas da Câmara, do Senado e de outros órgãos da União, abrangendo legisladores (parlamentares), intérprete das leis (juízes) e executivos (governantes). O objetivo do Ministério Público é coibir abusos, submetendo ao teto salarial qualquer outra remuneração (diárias, horas extras, adicionais, abonos etc.). Sendo o limite atual para salários de funcionários públicos de R$26.700, quem alcançar esse teto não poderia receber mais verbas para despesas com viagens ou moradias, nem acumular funções remuneradas ou aposentadorias.
Na verdade, é preciso entender que não se constrói cidadania alguma sem um profundo sentimento de justiça e de apego ao bem comum. Nenhum país, que se queira civilizado, pode permitir a obscena diferença entre um servidor que ganha o mínimo de R$600 e outro que, pela soma de ordenados e benefícios, pode receber até mais de R$60.000 mensais. Quer dizer, um funcionário público chega a um ganho mais de 100 (cem!) vez mais superior a outro! Com a agravante de que os recursos são provenientes do pagamento de nossos impostos, cuja finalidade deveria ser prover educação, saúde e transporte público e não enriquecer políticos e burocratas. Justiça social se consegue com meritocracia e não com esmola pública para captar votos de cabresto.
O problema é que a própria Justiça é injusta, pois, muitas vezes, seus representantes (os juízes, nas várias alçadas) julgam em causa própria, gozando dos privilégios da “Lei”. Daí a pergunta se realmente existe justiça, mesmo em países considerados democráticos. Esta interrogação ocupou o espírito de muitos estudiosos da natureza humana e do viver em sociedade. Um personagem de uma peça de Shakespeare, num diálogo sobre a resolução dos problemas do Reino, criticando os que cometem injustiças em nome da Lei, especialmente os advogados que, para defender criminosos, chegam a faltar com a verdade, exclama:
“Em primeiro lugar, matemos todos os advogados”!
Infelizmente, essa “Justiça” que permite tal vergonhosa disparidade de remuneração entre as várias categorias do funcionalismo público se fundamenta na Constituição vigente. Pudera! A Carta Magna de 1988 foi redigida por Senadores, Deputados, Governadores e Magistrados que, mais do que em liberdades democráticas, estavam interessados em defender seus interesses corporativos. Haja visto que um “Pai” da Constituição “Cidadã”, Senador por São Paulo, ao se aposentar, fez jus a cinco polpudas aposentadorias.
O que nos preocupa é que o egoísmo dos poderosos, quando é desmedido e tolerado, acaba criando revoltas populares, pondo em perigo as instituições democráticas, conforme está acontecendo em vários países do continente africano, dominados por ditadores retrógrados e gananciosos. A história nos ensina que democracia nenhuma pode vingar por muito tempo à sombra da injustiça social, da corrupção e da impunidade. Mesmo no nosso país, o aumento da criminalidade está diretamente relacionado com a roubalheira do erário público. O peixe fede a partir da cabeça: nossos governantes, não dando o justo destino ao patrimônio arrecadado pelos impostos pagos pelos cidadãos, dão exemplo e estímulo para desonestidade, ladroagem, banditismo. E os piores criminosos, os de colarinho branco, dificilmente são punidos.
Dr. pela USP e Professor Titular pela UNESP
Autor do Dicionário de Cultura Básica (Publit)
Literatura Ocidental e Forma e Sentido do Texto Literário (Ática)
Pensar é preciso e Pesquisando (Editorama)
www.salvatoredonofrio.com.br
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