“Só o amigo nos trai; o inimigo é sempre fiel!”
Nelson Rodrigues
Waldo Luís Viana*
“Extra, Extra: terrorista búlgara ganha a presidência do Brasil, rrotando o candidato tucano de direita! Extra, extra...”
Nem uma coisa nem outra. Serra sempre foi e será um homem de esquerda. No entanto, ele se modernizou, deixou de ser personagem de aparelho, estudante profissional da extinta UNE e se distinguiu daqueles dinossauros que só esperavam ordens (e o ouro) de Moscou. Mas a “carreira solo” lhe custou caro, incluindo em seu débito a desconfiança da pelegada, o aparelho estruturante do atual governo.
Do outro lado, Dilma tem passado de rígida disciplina de aparelho, fez e faz o que mandam, embora, amadurecida, tenha provado o gosto inefável do capitalismo, através da nova ideologia do socialismo de mercado, esposada pela dupla dinâmica Dirceu-Palocci, que integrarão, de dentro ou de fora, seu próximo governo.
Quem conhece um pouco de história e considerando o atual quadro eleitoral como farsa, vê a nossa frágil democracia ir pro brejo, caminhando celeremente do reino da fantasia para o palco ingrato do pensamento único. Tentemos, apesar de tudo e num sincero esforço, entender a realidade...
O governo, em seu competente laboratório de propaganda, criou uma falsa eleição, sob rígida fabricação do consenso, e transformou o que seria um pleito eletrônico com 132 milhões de eleitores num gigantesco plebiscito. Não é eleger o novo presidente, mas dizer “sim ou não” a Lula. O presidente que sai (sai?), como deus onipresente e onisciente cutuca as consciências desprevenidas e pergunta ao povo: “como é, você vai me trair?”. E o povo vai na valsa do sonho e ponto final...
A tal falsa oposição que um dia quis ver Lula sangrar, agora está se esvaindo em sangue, e tenta salvar a pele, a jugular e o pescoço. Assistimos, meio envergonhados, às traições tucanas pululando de vários lugares do país, com candidatos pedindo desculpas por não estarem na cesta do governo e escondendo o candidato da pretensa oposição.
Debandada geral de um lado (que ninguém é de ferro!) e clima de “já ganhou” do outro, com direito a iniciativas espertas de avanço sobre o latifúndio federal. Nota-se, nos bastidores, uma luta surda entre o PMDB fisiológico e o PT burguês, duas elites adestradas na ocupação de áreas e com as bocas enormes, numa luta incessante pelo poder, que é a única coisa que não param de fazer. Essa gente raciocina, de maneira pragmática, que eleição é jogo pra menino, porque o que interessa é o que vem depois...
E o povo assistindo a tudo, porque ainda não foi consultado – essa é que é a pura verdade –, olhando os horizontes meio perdido e consultando a catadupa de pesquisas, feitas por institutos quase todos amigos do rei.
O que vai acontecer, enfim? Vamos ingressar finalmente num bolivarianismo de mercado, elegendo uma mulher de esquema, a incógnita que ninguém conheceu, ou aceitar o bem composto e bom moço candidato tucano, com seu jeitinho burocrático e politicamente correto? Com qualquer resultado, o esquema do presidente em forjar um plebiscito ao invés de uma eleição normal parece ter dado certo.
E sua candidata, caso ganhe, tentará esboçar para o público interno que é realmente “alguém”. No entanto, como não é alguém de verdade, conquanto “rei morto, rei posto”, a criatura tende, por gravidade, com menos de um ano de governo, a se revoltar contra o seu criador, principalmente se as coisas não permanecerem como estão!
Tudo indica, inclusive, ao contrário da inebriante atmosfera de fantasia em que vivemos, que o país entrará sem dúvida em recessão em 2011, sobretudo para pagar a conta do saco de bondades que foi oferecido a todos no ano anterior. Fechadas as urnas, como se sabe, volta senhora de si a cruel realidade...
Com os barões da mídia devendo quase tudo ao governo e os militares, sem voz nem vez e de pires na mão, temos o campo lavrado para que a pelegada sindical burguesa, os movimentos sociais, organizações não-governamentais, os fundos de pensão e a direita patrimonialista e fisiológica, coligada feito parasita, venham a cevar a árvore da situação por mais quatro anos.
Muitos dirão que o sonho de Fidel Castro para o Brasil, acalentado no laboratório fumegante do Foro de São Paulo, finalmente irá se realizar. Mas é aí que a porca torce o rabo e a vaca, sem duplo sentido, vai pro brejo...
O país é tão grande e tão híbrido, tão diversificadas as forças infernais que querem dividir o poder, que não se estabelecem aqui regimes puros. O Brasil está mais para uma ditadura benigna, com um povo calado e domesticado pelo pão e circo, governado por uma mulher que vai passar o tempo se comparando com o mandatário anterior. Uma criatura, tentando sair do ovo e enfrentando o seu criador. Porque em política, como se sabe, não há agradecimentos eternos, nem na morte!
A luta promete ser boa, sobretudo se não houver câncer, de novo (esse é um dado da cruel realidade). Porque, se houver, pode ser que não tenhamos o Lula novamente, mas “Lulia”, que é o sobrenome do vice.
E não me diga que esse espetáculo você não quer assistir?
____
* Waldo Luís Viana é escritor, economista, poeta e está preparado para o que vai vir, portanto está escrevendo os últimos artigos, antes de enfrentar o exílio...
quinta-feira, 26 de agosto de 2010
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário