E aí? Vai encarar?
Milton Ortolon, secretário executivo do Ministério da Agricultura, não resistiu às primeiras horas da edição de VEJA nas mãos dos leitores
Por Reinaldo Azevedo
Caiu no próprio sábado, quando reportagem de Rodrigo Rangel revelou que um lobista, Júlio Fróes, atua livremente dentro do ministério, onde mantém uma sala tão ilegal quanto secreta. O seu, por assim dizer, ambiente de trabalho fica justamente na Comissão de Licitação da pasta. Por que não? Fróes chegou à Agricultura pelas mãos de Ortolon, braço direito do ministro Wagner Rossi até anteontem e seu amigo há 25 anos.
A reportagem de VEJA é eloqüente o bastante para que Ortolon não tente articular uma desculpa. Melhor cair fora. Mas só ele? E Wagner Rossi? É claro que Dilma sempre pode pensar que Erenice Guerra, sua secretária-executiva na Casa Civil e depois ela própria ministra, operava “por conta”. Ocorre que, no caso da Agricultura, há ao menos uma decisão tomada pelo próprio ministro que beneficiou o lobista espancador de repórteres. Um advogado de uma empresa que tem a receber uma dívida de R$ 150 milhões da Conab revela que representantes da estatal lhe cobraram a bagatela de R$ 22 milhões de propina para efetuar o pagamento. E agora?
Reportagem de O Globo (ver abaixo) informa que o governo está disposto a agir de modo diferente com o PMDB. Entende-se, pois, que a dita “faxina” da presidente Dilma pode até passar pelo porão, onde habitam os patriotas de Valdemar Costa Neto, do PR, mas demonstra não ter fôlego para chegar ao primeiro andar. Acreditar que havia um perverso Ortolon na pasta, que agia ao arrepio do seu chefe, parece ser história para boi dormir. Voltamos à frase-emblema: “A cada enxadada, uma minhoca”. É retirar o véu, e lá estão os aliados a agir segundo os métodos que foram se tornando consagrados na gestão petista. Porque é preciso lembrar sempre: esta é uma gestão do PT. O que isso significa?
Com o lulo-petismo, os agentes políticos puderam todos atuar segundo a sua natureza. É preciso lembrar que o PT ascendeu ao poder brandindo o discurso da ética. Quem conhecia a turma por dentro não dava dez tostões para a conversa, mas a fantasia publicitária prosperou. O PT não só fez acordo com forças que antes dizia repudiar como lhes conferiu mais poderes do que tinham. Lula e seus rapazes submeteram os agentes do atraso a uma espécie de “aggiornamento”, de atualização. A esquerdopatia que toma conta da academia e de boa parte da imprensa tenta esconder o óbvio: FHC tinha, sim, em sua base de apoio, uma parte ao menos da escória que se bandeou para o petismo, mas há uma diferença importante. Essa gente estava na periferia do poder, não no centro. UMA COISA É A CORRUPÇÃO COMO DISFUNÇÃO; OUTRA, DISTINTA, É TÊ-LA COMO MÉTODO.
E que fique claro: não há uma miserável razão para acreditar que o padrão seguido nos ministérios sob o comando do PT seja diferente. Nos bastidores, aliás, algumas figuras graúdas do partido vivem em pânico. Temem que apareça algo cabeludo em seus respectivos feudos e que isso detone um pedido de CPI. Há aliados do governo Dilma que estão doidos para dar o que chamam “troco”. Muitos deles perguntam a céu aberto onde estão as denúncias contra ministérios petistas. Acham-se injustiçados; os mais nervosos chegam a dizer que o PT está por trás das denúncias. No caso da Agricultura, convenhamos, ninguém precisa de um petista para denunciar a atuação aberta de um lobista, que chega a contar com estrutura de apoio da própria pasta para exercer o seu “trabalho”.
Se vocês fizeram uma pesquisa, verão, por exemplo, que o agora senador Walter Pinheiro (PT-BA) se queria uma espécie de consciência crítica do Parlamento e do seu próprio partido. Há uma emblemática declaração sua no Globo de hoje: “Não dá para ficar nessa de ataques múltiplos. Se isso virar prática corriqueira na base, será muito complicado. Vai ter uma hora em que não sobrará ninguém. É perigoso dar um tratamento isonômico a situações diferentes”.
Entendi! “Vai ter uma hora em que não sobrará ninguém…” É claro que Pinheiro expressa, assim, uma avaliação sobre a moralidade de seus aliados e do próprio governo. Como certamente não conta com a mudança de costumes do lobo, está pedindo indiretametne que se deixe o bicho em paz. E, para que sobrem muitos, então é preciso mudar de rumo, mudar de prosa, deixar pra lá. O que seria um “tratamento não-isonômico?” A situação do Ministério da Agricultura é, de fato, “distinta”: nunca antes na história destepaiz, acredito, um lobista de empresas privadas manteve um “escritório” na Comissão de Licitação de um ministério e distribuiu propinas ali, pessoalmente, ao vivo.
Os potenciais atingidos por uma eventual faxina para valer mandam recados e ameaças. A síntese poderia ser esta: “Na hora em que algum petista cair na rede, haverá CPI; cansamos desta história”. Do ponto de vista estrito da narrativa, faz sentido. O garantidor da imoralidade foi aquele que hoje mais se mobiliza para pôr um ponto final nesta história de apuração: Lula. Junto com as alianças que ele costurou, vinham uma escritura com o “ministério de porta fechada” e um atestado de impunidade. O modelo era perfeito: cada partido fica com o seu quinhão, administra e rouba como bem quer. Isso faz uma sólida maioria no Congresso, ninguém investiga ninguém, e o PT fica de mãos livres para “hegemonizar” o processo.
Não contavam com a imprensa no meio do caminho — daí que alguns até partam para o espancamento de repórteres. Dilma já se livrou de dois ministros — o terceiro, Nelson Jobim, não caiu sob suspeita de corrupção — e de uma penca de “servidores” do Dnit. A avaliação de seu governo, “punindo os corruptos”, segue estável, segundo o Datafolha. Há uma leitura meio torta que consiste no seguinte: “Ah, estão vendo?, os casos de corrupção não alteraram a avaliação que se tem dela”. Huuummm… Mandando larápio embora, fica tudo igual. Resta saber como ficará caso ela decida passar a mão na cabeça da canalha.
Arremato lembrando uma questão óbvia, mas que tem de ser dita para que não se a perca de vista o processo se fique com um juízo distorcido do conjunto: esse modo de governar já teve como “gerentona” a própria Dilma Rousseff e colaborou para a sua eleição. É por isso que patriotas do PR, do PMDB e outros agora cobram “reconhecimento” e “reciprocidade”.
08/08/2011 às 6:27
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