Vários websites na Internet promovem a violência e o quebra-quebra urbano no seio de uma “sociedade doente”, segundo o primeiro ministro
David Cameron
David Cameron
POR FRANCISCO VIANNA
Diversos sites da Internet estão conclamando os islâmicos para a ‘jihad’ (guerra santa) incitando ontem seus partidários a aproveitar a onda de baderna e quebra-quebra que sacode a Grã Bretanha pela “causa” islâmica radical, conforme informou a agência americana de inteligência ‘SITE’, que se dedica à vigília dos websites islâmicos.
"Através de mensagens eletrônicas, estas páginas online instam os manifestantes britânicos a continuar sua ação por meio das redes sociais, com a finalidade de fazer surgir no país um movimento de protesto semelhante aos que ocorrem atualmente em vários países árabes", disse a SITE.
Cita, como exemplo, uma mensagem que foi postada ontem no website ‘Shumukh al-Islam’, que orientava os jihadistas a "se infiltrarem nas redes sociais britânicas, Facebook e Twitter" com chamadas tais como "Todos nós somos Mark Duggan", em referência ao taxista morto pela polícia de Londres, que foi o acontecimento que deu origem aos distúrbios na Inglaterra.
"O que ocorre hoje em dia em Londres deve ser visto pelos ‘mujahedins’ (combatentes islâmicos) como uma oportunidade de se mobilizarem para modificar o ‘estado de coisas’ mais facilmente", escreveu no site um ‘usuário’ chamado Abu al-Harith al-Qandahari, segundo a tradução da SITE.
"Os mujahedins devem começar a recrutar; têm uma preciosa oportunidade para tal, e devem fazê-lo já, uma vez que a polícia britânica tentará rapidamente controlar a baderna", acrescentou.
A SITE destacou também que várias mensagens em foros jihadistas conclamam pessoas que falam bem o inglês a difundir slogans hostis contra o governo britânico nas redes sociais, em particular nas páginas online dos clubes de futebol mais populares.
AÇÃO DA SCOTLAND YARD
A ‘Scotland Yard’ tem difundido as imagens das câmeras que assinalam os autores da baderna e do assalto a lojas.
Foto: Scotland Yard
Muitos ingleses estão fazendo circular pela Internet nas redes sociais as fotos distribuídas pela Scotland Yard obtidas de câmeras que filmaram grupos encapuçados e mascarados em Londres e em outras cidades do Reino Unido praticando baderna, quebra-quebra, saques, e incêndio de lojas.
A famosa polícia inglesa, que difunde grande parte das imagens na WEB, está instando a população a ajudar na "caça" aos responsáveis pela baderna conclamando inclusive o povo a usar as redes sociais para acelerar esse processo de identificação.
Até o website de fotos Flikr foi usado pela Scotland Yard para publicar umas 25 imagens de pessoas que saqueavam lojas e incendiavam veículos na capital.
Uma campanha individual, chamada de "pegue um saqueador" (Catch a Looter), foi criada por um usuário britânico que postou num blog fotos de elementos que participaram de atos de violência, os quais são logo analisadas pelas autoridades para realizar prisões. Há já muita gente presa em toda a Grã Bretanha em decorrência da presente onda de violência.
"O país inteiro está chocado com as terríveis cenas de vandalismo, baderna, saques, e incêndios", disse o primeiro ministro David Cameron, que prometeu que fará o necessário para por toda essa gente atrás das grades e afirmou que irá estudar seriamente a possibilidade de expulsá-la do país.
A chuva e a maciça presença ostensiva de policiais armados nas ruas de Londres parecem ter evitado mais uma madrugada de distúrbios.
"Precisamos mostrar ao mundo, horrorizado com o ocorrido, que os responsáveis por tudo não representam o pensamento da população do país e que nós não os queremos por aqui", mormente a menos de um ano dos Jogos Olímpicos de Londres.
Do discurso à prática, a expectativa é de uma ação intensa do governo para “capturar e até expulsar do país pessoas que querem subverter a cultura e os valores civilizacionais cristãos e democráticos do povo britânico”, disse o primeiro ministro perante o Parlamento. Mais de mil pessoas já foram presas.
Prometendo que a polícia manterá o maior número de policiais na cidade em policiamento ostensivo e "não permitirá que uma cultura do medo seja implantada nas ruas da cidade, e tudo será feito dentro do necessário para que a lei e a ordem possa ser restaurada e mantida, mesmo que isso inclua uma ‘filtragem preventiva’ de todas as comunidades", salientou Cameron.
“Não haverá complacência com a violência de rua e a delinquência será tratada com o rigor que a situação exige. Nós os prenderemos onde estiverem, os processaremos, os castigaremos e, oportunamente, até, os expatriaremos", prometeu Cameron, que nos últimos dias endureceu sua linguagem ante a gravidade dos fatos que ocorrem neste país.
Ante o mal estar social na Grã Bretanha, Cameron prometeu um rigoroso ‘contra ataque’ por parte das forças de segurança interna e que a polícia será dura com os baderneiros.
Os destroços de uma loja no bairro de Croydon.
Foto: AFP
Foto: AFP
A violência começou no sábado passado no bairro de Tottenham, ao norte de Londres, onde uma marcha de protesto pela morte de Mark Duggan, um homem de cor, de 29 anos, que foi baleado em circunstâncias misteriosas pela polícia, acabou se tornando uma verdadeira batalha campal que degenerou para saques, incêndios de edifícios e devastação.
Por um ‘efeito contágio’ impulsionado pelas redes sociais, como o Twitter e o serviço de mensagens do Black Berry, o insólito irromper da violência acabou por se estendendo a mais de 25 subúrbios da capital e na segunda feira passada à noite teve seu pico, ante a total inação da polícia, que se mostrou impotente perante o caos.
PATRULHAS CIVIS
Apesar de desde terça feira passada Londres estar sendo monitorada por 16.000 agentes – o triplo dos que havia no dia anterior –, em vários subúrbios os vizinhos começaram e se organizar em patrulhas de vigilantes e a fazer rondas para se protegerem de novos incidentes.
De fato, os três novos mortos por esta revolta, que põem em evidência as profundas tensões sociais, foram homens de origem asiática que foram atropelados na noite do início da balbúrdia quando tentavam proteger suas lojas de saques em Birmingham.
Um inglês de 32 anos foi detido por este triplo homicídio que, ademais, disseminou temores de eventuais "batalhas raciais" entre as comunidades afro-caribenhas e asiáticas da cidade.
Birmingham, com cerca de um milhão e meio de habitantes, e cenário no passado de fortes enfrentamentos raciais, ostenta uma das populações com maior diversidade cultural do Reino Unido. Segundo o Escritório Nacional de Estatísticas, 33,3% de seus habitantes não são brancos, 20% são de descendência asiática e 9% de descendência africana ou caribenha.
Em sua segunda aparição ante a mídia desde o seu regresso, Cameron prometeu "mão dura" e castigo aos criminosos. Além disso, afirmou que os protagonistas dos desmandos – em geral gente jovem e humilde de diversas raças – serão identificados e presos.
"É simplesmente inaceitável que esta violência continue. Não vamos permitir que isto ocorra de novo em nosso país. Não vamos permitir que a cultura do medo seja implantada em nossas ruas", disse Cameron.
A polícia – odiada pela maioria dos jovens dos subúrbios – está conclamando a população a colaborar, identificando as pessoas que aparecem nas fotos e nos filmes durante os saques.
Em meio à consternação geral pela devastação, prejuízo, fúria e violência sem precedentes, fiel reflexo do mal estar social por uma crise econômica que provocou duríssimos cortes, chegou às raias do absurdo de constar, entre os 805 saqueadores presos, um professor de escola primária.
Trata-se de Alexis Bailey, um homem de cor de 31 anos, cuja foto – na qual, humilhado, tentava cobrir o rosto com um jornal ao sair do tribunal de Highbury – estava estampada na capa do jornal vespertino ‘London Evening Standard’. Bailey, que ganha 1.000 libras (1.418 dólares) por mês como professor, foi preso quando saqueava uma loja de artigos eletrônicos de Croydon à meia noite de segunda feira da semana passada.
Parece que o que mais impacta a opinião pública, que continua chocada pelo ocorrido nos últimos dias, é o fato de que muitos dos autores dos saques, entre os quais universitários e até meninos de 7 anos, não são ladrões usuais, mas pessoas aparentemente "normais".
OS BONS MAUS
Neste sentido, também causou sensação a estória de Linette Livingstone, uma mãe que pensava que seus dois filhos gêmeos de 19 anos, Isha y Micha, estudantes, estavam na escola no domingo à noite.
Mas, não: segundo a polícia, que os deteve, eles estavam a saquear a loja Curry's, outra revendedora de eletrônicos, em meio dos distúrbios que houve em Brixton, ao sul desta capital.
"São ‘bons’ garotos e que não precisam roubar, e não os eduquei para isso", declarava a mãe à imprensa, horrorizada.
Talvez por esse fato, Cameron, logo depois de deixar claro que o "contra ataque" já tinha começado, disse em sua peroração que a "sociedade inglesa está enferma".
"Há bolsões em nossa sociedade que não só estão falidos, como também francamente doentes. Em partes de nossa sociedade há uma completa falta de responsabilidade, gente que se permite pensar que o mundo lhe deve alguma coisa", denunciou, utilizando, uma vez mais, palavras muito duras, como se quisesse demonstrar essa determinação que evidentemente faltou ao governo no início dos choques.
Resta agora verificar se o "contra ataque", que hoje será debatido pelo Parlamento, convocado de urgência, funcionará ou não.
Há um grande ceticismo entre as pessoas.
Uma vinheta do ‘The Daily Telegraph’ mostrava na semana passada um casal de turistas que perguntava a um tradicional ‘bobby’ onde está o estádio Olímpico.
E este lhe responde: "Dobrem à esquerda depois do segundo ônibus incendiado e à direita depois da loja de eletrônicos saqueada".
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