Os
saqueadores
Ives Gandra da Silva Martins (*)
O Estado de S.Paulo 25 Setembro 2014
Ives Gandra da Silva Martins (*)
O Estado de S.Paulo 25 Setembro 2014
Ayn Rand (1905-1982) foi uma
filósofa, socióloga e romancista com aguda percepção das mudanças que ocorreram
na comunidade internacional, principalmente à luz do choque entre o sucesso do
empreendedorismo privado e o fracasso da estatização populista dos meios de
produção, na maior parte dos países de ideologia marxista.
Seu romance A Revolta de Atlas,
escrito há mais de 50 anos, talvez seja o que melhor retrata a mediocridade da
corrente de assunção do poder por despreparados cidadãos que têm um projeto para
conquistá-lo e mantê-lo com slogans contra as elites em "defesa do
povo", o que implica a destruição sistemática, por incompetência e inveja,
dos que têm condições de promover o desenvolvimento.
No romance, os medíocres ameaçam o
governo dos Estados Unidos e começam a controlar e assumir os empreendimentos
que davam certo, sob a alegação de que os empreendedores queriam o lucro, e não
o bem da sociedade. Tal política tem como resultado a gradual perda de
competitividade dos americanos, o estouro das finanças, a eliminação das
iniciativas bem-sucedidas e a fuga dos grandes investidores e empresários, que
são perseguidos, grande parte deles desistindo de administrar suas empresas,
com o que os governantes se tornam ditadores e o povo passa a ter os serviços
públicos e privados deteriorados.
Não contarei mais do romance, pois
o símbolo mitológico de Atlas, que sustenta o globo, é lembrado na revolta dos
verdadeiros geradores do progresso da Nação.
O que de semelhante vejo na
mediocridade reinante no governo federal do Brasil, loteado em 39 ministérios e
22 mil amigos do rei não concursados, vivendo regiamente à custa da Nação, sob
o comando da presidente da República, é a destruição sistemática que, nos
últimos anos, ocorreu com a indústria brasileira, abalada em seu poder de
competitividade por um Estado mastodôntico, que sufoca a Nação com alta
inflação, elevada carga tributária, saldo desprezível na balança comercial,
superávit primário ridículo e maquiado, rebaixamento do nível de investimento
exterior, desvio em aplicações de capitais que deixam de ser colocados no País
para serem destinados a outras nações emergentes, perda de qualidade no ensino
universitário e na assistência social.
Por outro lado, os programas
populistas, que custam muito pouco, mas não incentivam a luta por crescimento
individual, como o Bolsa Família (em torno de 3% do Orçamento federal),
mascaram o fracasso da política econômica.
O próprio desemprego, alardeado como grande conquista - leia-se subemprego -,
começa a ruir por força da queda ano após ano do produto interno bruto (PIB),
que cresce pouco e cada vez menos, e muito menos que o de todos os países
emergentes de expressão.
É que o projeto populista de
governo, que o leva a manter um falido Mercosul com parceiros arruinados, como
Venezuela e Argentina, sobre sustentar Cuba e Bolívia, enviando recursos que
seriam mais bem aplicados no Brasil, fechou portas para o País celebrar acordos
bilaterais com outras nações.
Prisioneiro que é do Mercosul, são poucos os acordos que mantemos. Tal modelo
se esgotou e, desorientados, os partidários de um novo mandato não sabem o que
dizem e o que devem fazer. Basta dizer que o "ex-ministro da Fazenda em
exercício" declarou, neste mês de eleição, que em 2015 continuará com a
mesma política econômica, que se revelou, no curso destes últimos anos, um dos
mais fantástico fracassos da História brasileira. Parece que caminhamos para
uma estrada semelhante à trilhada por Argentina e Venezuela.
No romance de Ayn Rand, quando os
verdadeiros empreendedores, que tinham feito a nação crescer e a viam
definhando, decidiram reagir, denominaram os detentores do poder, nos Estados
Unidos imaginário da romancista, de "os saqueadores". Estes, anulando
as conquistas e os avanços dos que fizeram a nação crescer para se enquistarem
no poder, por força da corrupção endêmica, da incompetência, de preconceitos e
do populismo, levaram o país à ruína.
À evidência, não estou alcunhando
os 39 ministérios e os 22 mil não concursados de integrantes de um grupo de
"saqueadores", como o fez Ayn Rand. Há, todavia, na máquina
burocrática brasileira - com excesso de regulamentação inibidora de
investimentos, assim como de desestímulo ao empreendedorismo, e escassez de
vontade em simplificar as normas que permitem o empreendedorismo, apesar do
esforço heroico e isolado de Guilherme Afif Domingos, uma gota no oceano -,
algo de muito semelhante entre o descrito em seu romance há mais de 50 anos e o
Brasil atual.
Basta olhar o "mar de lama" da corrupção numa única empresa
(Petrobrás). O que mais impressiona, todavia, é que, detectada a ampla
corrupção na empresa - são bilhões e bilhões de dólares -, o governo tudo faça
para congelar a CPI e não desventrar para o público as entranhas dos mecanismos
deletérios e corrosivos que permitiram tanto desvio de dinheiro público e
privado.
O simples fato de não querer apurar
a fundo, de desviar a atenção desse terrível assalto à maior empresa pública
privada, procurando dar-lhe diminuta atenção, como se o governo nada tivesse de
responsabilidade, torna suspeita a gestão, pelo menos na denominada culpa in
vigilando.
Precisamos apenas saber se o
eleitor brasileiro está consciente de que, se não houver mudança de rumos, o
Brasil de país do futuro, como escreveu Stefan Zweig, se tornará, cada vez
mais, o país do passado, vendo o desfile das outras nações passando-lhe à
frente, por se terem adaptado às mudanças de uma sociedade cada vez mais
complexa e competitiva, em que apenas os países que se prepararem terão
chances.
*Ives Gandra da Silva Martins
é professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo, UNIFMU, do Ciee/O Estado de S. Paulo, da Eceme e da ESG. É presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomércio-SP, fundador e presidente honorário do Centro de Extensão Universitária
é professor emérito das universidades Mackenzie, Unip, Unifieo, UNIFMU, do Ciee/O Estado de S. Paulo, da Eceme e da ESG. É presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomércio-SP, fundador e presidente honorário do Centro de Extensão Universitária
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