POPULARIDADE E CLASSE
C
“Se 50 milhões
acreditam numa besteira,
a
besteira continua sendo uma besteira.”
Bertrand
Russell
Waldo Luís Viana*
Vivemos os tempos áureos da
estrepitosa popularidade da “presidenta” Dilma. Sua posição nas pesquisas é até
proporcionalmente bem melhor que a de seu predecessor, o ex-presidente “nunca
dantes nestepaiz”...
Infelizmente, tal patamar feérico
talvez possa ser explicado pelos dois salários mínimos recebidos por até 61% da
população ativa e a constatação de que 67% do povo brasileiro não passam além do
curso primário, segundo dados do próprio IBGE (2010). Talvez seja
essa a massa crítica capaz de nos fazer entender a inacreditável aceitação da
atual mandatária. Pobre país!
Parece, então, que navegamos em
águas límpidas, com céu de brigadeiro, sem qualquer inimigo visível à
disposição, mas tal não é verdade. Senão vejamos:
· temos quase 30 partidos, o que não
recomenda nenhuma reforma política séria, em virtude de ficarmos submersos no
mais hipócrita regime de opinião e leilão de virtudes públicas;
· o Estado aparelhado virou dogma,
mas é contrário ao bom funcionamento de uma verdadeira sociedade de
massas;
· os pelegos não têm inteligência
nem competência para gerir um Estado complexo, cujas demandas estão muito além
da reprodutibilidade da corrupção e do compadrio;
· o Estado é colonizado por
interesses privados e isso não depende da ideologia do partido que desfruta do
governo;
· a pretensa descentralização do
poder, via coalizão, com “porteira fechada para cargos nos ministérios” não
funciona na prática nem fortalece os partidos;
· o sindicalismo de resultados é
mera fachada para uma cobrança eterna de pedágios e verbas governamentais, em
troca do silêncio de cemitério nas praças públicas;
· governar sob um modelo exaurido,
com abundância de cargos de confiança (22 mil) e uma burocracia não profissional
a serviço de interesses menores, é garantia de fracasso a longo
prazo;
· o Estado atrasado e
patrimonialista é o paradigma de um país velho que precisamos superar;
· o partido no governo só tem
objetivos eleitorais, uma espécie de “partido burguês com dentadura”, agindo
como um centrão aglutinador de oligarquias atrasadas;
· o governo finge que deseja uma
reforma tributária, mas não vai fazê-la, porque a classe sindical e a militância
precisam continuar penduradas no Estado perdulário e agigantado;
· os pelegos, ONGs, movimentos
sociais, políticos e empreiteiras insistem em se manter domesticados, em troca
de cargos, verbas e superfaturamentos, tencionando engordar, com os caixas dois,
as caixinhas eleitorais;
· os comensais do bolsa-família são
conservadores, não querendo promoção social nem empregabilidade e preferindo
ver o governo sustentar eternamente os seus respectivos
segmentos;
· o vale-tudo do socialismo de
mercado locupleta-se da corrupção e do servilismo, tencionando desmoralizar
os mecanismos de controle, fiscalização e a própria ordem
jurídica;
· o governo não consegue se libertar
da camisa-de-força da dívida interna e de suas consequências brutais, a partir
do superávit primário;
· e, finalmente, a
desindustrialização é consequência do custo-Brasil, de impostos excessivos, da
logística e infraestrutura sofríveis, pouco desenvolvidas e mal-assistidas.
Tal quadro, sumariamente composto,
gera um governo particularista, em que a “presidenta” opera como figura apagada,
medíocre e de mera transição. Seus projetos praticamente não saem do papel ou
estão originalmente contaminados pela corrupção onipresente. Diríamos até que
sua administração anda “empacada”...
Por outro lado, a grande invenção
do governo, que contribuiu efetivamente para a sua sustentação popular e
eleitoral, foi o surgimento e manutenção de uma classe C, formada a partir de
padrões de consumo popular e de um nível de renda em média de
1.500 dólares.
A classe C, completamente
destituída de ideologia, só quer mesmo é consumir. Tal fato sociológico é de tão
grande envergadura que a mídia, nos últimos anos, tem aberto francamente as
portas para esse contingente, manobrando a programação das redes de televisão no
sentido de agradar esses emergentes de ocasião.
Não é à toa que se investe em
temáticas suburbanas, em duplas caipiras e cantores evangélicos nas novelas e
nos intervalos comerciais, povoando o horário nobre de ícones que somente
interessem àquela classe. A pretexto de inclusão social, aprofunda-se ainda mais
o abismo entre um país preferido pela norma culta de outro, mitificado pela
deseducação, pelos preconceitos às avessas, erros propositais de português,
termos chulos e programas de ofertas aos carentes e necessitados.
Como esse contingente
constitui-se, hoje, de cerca de 38% da população, tem impulsionado as
modificações da economia e da cultura, sendo a alienação ideológica um traço
distintivo de comportamento que o sujeita a toda espécie de
manipulações.
Nesse contexto, contemplamos aí um
ovo da serpente de futuros Hitlers e Mussolinis, cujos objetivos de ódio supõem
sempre o cancelamento do regime democrático em nome do culto à personalidade.
Quem não está habituado a pensar, quando o “calo econômico” aperta, está sujeito
a aceitar quaisquer soluções fantasiosas e diabólicas, mesmo que firam de morte
o Estado Democrático de Direito.
A classe C é, pois, fascistóide em
suas origens, porque não tem rumo nem destino. Ela aplaude quem a faz
sobreviver, comer e consumir. Enquanto for assim, tudo bem: o dirigente de
ocasião terá assegurada a popularidade. No entanto, se o tempo fechar, com
nuvens plúmbeas, logo a sustentação do regime demonstrar-se-á frágil e
proporcional à saúde de nossos últimos mandatários.
Afinal, os truques de marketing
esgotam-se e o que era considerado verdade passa a ser mentira, mesmo para os
espíritos dorminhocos. E os espíritos despertos evidentemente desconfiam muito
da calmaria podre em que estamos vivendo...
Afinal, popularidade é coisa
invisível, pouco confiável e não enche barriga de ninguém, muito menos da classe
C...
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*Waldo Luís Viana é escritor,
economista, poeta e adora enxergar contra a corrente...
Teresópolis, 7 de maio de
2012.
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