05/05/2012
às 8:02SIM, O JORNALISMO PRECISA TOMAR CUIDADO PARA NÃO SERVIR AO CRIME ORGANIZADO E ÀQUELES QUE QUEREM DESMORALIZAR A DEMOCRACIA
Uma coisa vocês não
podem negar a este escriba, não é? Desde o primeiro dia, apontei a ação dos
petistas — encabeçados por Lula, José Dirceu e Rui Falcão — para usar as
tramoias de Carlinhos Cachoeira e seu grupo para tentar melar o processo do
mensalão e para intimidar a imprensa. A coisa agora é escancarada! Ontem, Rui
Falcão (ver posts abaixo) perdeu qualquer restinho de pudor e declarou
que a “mídia” será o próximo alvo do governo. Tudo indica que falou apenas em
nome da banda heavy metal do PT, não do Planalto. Trato do assunto em
outro post. Muito bem. “Melar” o mensalão compreende, entre outras coisas, um
esforço para desmoralizar ministros do Supremo Tribunal Federal e o
procurador-geral da República, Roberto Gurgel. A imprensa independente — aquela
que não é financiada com dinheiro público nem é subordinada a uma rede criminosa
montada na Internet (isso ainda vai dar o que falar, anotem aí) — tem de tomar
cuidado para não fazer, involuntariamente, o serviço da bandidagem.
Infelizmente, aqui e ali, isso está acontecendo. Dado o pano de fundo, exporei
aqui um caso emblemático. Antes de fazê-lo, no entanto, é preciso proceder a uma
digressão para esclarecer algumas coisas.
Começa a digressão
Já escrevi aqui — e Eurípedes Alcântara, diretor de
Redação da VEJA, divulgou uma Carta de Princípios a respeito da ética no jornalismo — que a qualidade
moral da fonte não faz a qualidade da informação. Uma pessoa decente e muito
bem-intencionada pode induzir um repórter ao erro. Um bandido pode dar uma
informação relevante. O importante é o jornalista saber para quem está
trabalhando. Não tenho receio nenhum de debater abertamente o que alguns
vagabundos andam dizendo sobre VEJA. O inquérito que veio a público demonstra
que o profissional da revista trabalhava a serviço da verdade e do interesse
público. Quanto mais isso fica evidente, mais a corja radicaliza na retórica. A
reportagem recebeu informações de Cachoeira? Também dele, a exemplo de uma penca
de jornalistas. Ou algum repórter investigativo de Brasília se oregulha se só
falar com beartos e beatas??? Matérias foram feitas só com informações do
dito-cujo? Isso é uma piada, uma fantasia! Tanto as reportagens de VEJA eram
fundamentadas, com dados inquestionáveis, que muitas delas estão, sim, na raiz
da demissão de ministros e servidores. Mas atenção! Quem demite é a
presidente Dilma Rousseff. VEJA não tem esse poder. Se a primeira mandatária
tomou tal decisão, encontrou certamente razões muito fortes para tanto.
Não deve ter sido só para não deixar chateada a equipe da revista,
certo?
Jornalista não tem
de fazer um tribunal de moral e cívica antes de falar com a fonte. Tem é de ter
a certeza de que não trabalha para ela, mas para o interesse público. E tem de
apurar muito bem os fatos, reitero, para não servir a bandidos, como fizeram,
querendo ou não, os que sustentavam a veracidade do Dossiê Cayman. Naquele caso,
sim, em vez de apuração, decidiu-se dar crédito à conversa de vigaristas.
Tentaram, por exemplo, fazer de Luiz Antonio Pagot uma pobre vítima do
inexistente complô VEJA-Cachoeira. Gravações que vieram a público, conforme demonstrei aqui, mostram o ex-chefão do Dnit se entendendo com a turma
de Cachoeira. Vale dizer: aquela acusação era só uma vingança dos ressentidos
com VEJA. Ressentidos por quê? Alguns porque perderam a boquinha. Outros porque
não se conformam com o fato de o Brasil ser uma democracia — não é mesmo, Rui
Falcão?
Vale dizer: o que
dizem Cachoeira e seus rapazes — ou os seres mais impolutos — não pode ir parar
nos sites, revistas e jornais sem que se verifique a veracidade das acusações.
Ou se corre o risco de, sob o pretexto de combater a bandidagem, agredir
instâncias do estado de direito. Como quer José Dirceu. Como quer Lula, Como
quer Rui Falcão. Fim da digressão.
Agora o
caso
Ontem, o Estadão Online publicou um texto de Ricardo Brito, da Agência Estado, cujo título era: “Grupo de Cachoeira tentou interferir em habeas corpus”. O busílis era o seguinte: o prefeito de Piraquê (TO), Olavo Júlio Macedo, estava preso, e a turma o queria solto. Gleyb e Eney, dois homens do esquema do contraventor, conversam a respeito do caso e dizem que será julgado o habeas corpus. Muito bem. Transcrevo em vermelho um parágrafo da reportagem. Leiam com atenção. Volto em seguida:
Às 15h30 daquele
dia, Gleyb disse, em telefonema a um interlocutor não identificado pela PF, que
estava no Senado para se encontrar com Demóstenes Torres (sem
partido-GO), suspeito de envolvimento com Cachoeira. Às 16h44, o integrante do
grupo de Cachoeira afirmou, em nova ligação, que iria passar em um ministério e
no Supremo.
Um minuto depois, Gleyb pergunta, numa ligação para Eney, se há “mais alguma coisa” para conversar. O advogado responde que é preciso manter contato no Supremo, visando liberar o prefeito cujo habeas corpus estava com Gilmar Mendes.
Um minuto depois, Gleyb pergunta, numa ligação para Eney, se há “mais alguma coisa” para conversar. O advogado responde que é preciso manter contato no Supremo, visando liberar o prefeito cujo habeas corpus estava com Gilmar Mendes.
Voltei
O que o trecho sugere? O óbvio! Que Demóstenes e o tal Geyb foram falar com Gilmar Mendes em favor do prefeito. Isso se deu no dia 9 de junho do ano passado. O senador ainda era uma referência de severidade e correção até para seus adversários. Ouvido, o ministro diz que ninguém foi procurá-lo. MAS ATENÇÃO! SE ALGUÉM O PROCUROU OU NÃO, ISSO É IRRELEVANTE. O RELEVANTE VEM AGORA!!!
GILMAR
MENDES NEGOU DUAS VEZES A CONCESSÃO DE HABEAS CORPUS AO TAL
PREFEITO! No dia 29 de junho e no dia 5 de dezembro de 2011. Muito
bem! Agora faço a pergunta essencial para que avaliemos os riscos que estamos
correndo com certo tipo de apuração e reportagens que andam na praça — mesmo na
imprensa que tem compromisso com a seriedade. Lá vai:
E SE GILMAR MENDES TIVESSE RECONHECIDO MOTIVOS TÉCNICOS, JURÍDICOS, PARA CONCEDER O HABEAS CORPUS?
Agora o ministro estaria lascado, e aquela fala serviria como evidência de que ele estaria trabalhando para o grupo de Carlinhos Cachoeira. Por sorte, ele entendeu duas vezes que o pedido de habeas corpus era descabido.
Entenderam?
Vocês entenderam a natureza da questão? Uma coisa é o que a gangue diz entre si, suas bravatas, suas demonstrações de influência. Outra, distinta, são os fatos. O repórter afirma: “Esta é a segunda vez que pessoas ligadas a Cachoeira aparecem em grampos telefônicos comentando casos que estão nas mãos Mendes.” Incrível! Mesmo com a evidência de que a decisão do ministro não atendeu às expectativas da turma, mantém-se a sombra da suspeita. Na primeira vez, num caso envolvendo uma estatal de Goiás, Demóstenes faz referência a um procedimento regular de Mendes, que não teve mérito ainda decidido. Revela apenas a sua expectativa. Mesmo assim, o senador apresenta a coisa como decorrência de sua influência.
Ora, ministros do
Supremo, agora, não são mais livres para decidir segundo a lei. Habeas corpus? O
jeito vai ser dizer sempre “não”! Vai que surja uma conversa de alguém: “Ah, já
falei com o ministro X, está tudo certo!” Cada membro do Supremo teria de ter o
seu próprio sistema “Guardião” e grampear o país inteiro. Só assim teriam a
certeza de que sua decisão estaria a salvo de ilações.
O mal que
Demóstenes fez
Um episódio como esse dá conta do mal que Demóstenes fez à política — muito maior do que ele imagina, acho. Ele era um medalhão do Senado. Um senador manter conversar com ministros do Supremo, do STJ, ministros de estado, autoridades etc. é parte do jogo. Quem lhe recusaria, em princípio, uma audiência? Que diabos, no entanto, ele dizia a seus interlocutores sobre esses encontros? Num outro pleito seu, já nem me lembro sobre qual assunto, não diz ele que mantinha boa conversa com a ministra do Meio Ambiente? Não se relacionou, também, com autoridades dos ministérios da Educação e da Saúde?
Este caso em que o
nome de Mendes é citado deveria servir de alerta para os jornalistas que lidam
com o material que foi vazado sobre o inquérito — a propósito: suponho que os
vazadores sejam as carmelitas descalças, né? O ministro poderia ter concedido o
habeas corpus de boníssima-fé. E estaria agora encalacrado.
Não estão por aí os
criminosos da Internet a sustentar que as fitas que traziam imagens do “governo
paralelo” de Dirceu — fitas do circuito interno do hotel, reitere-se — foram
passadas à VEJA por Cachoeira em troca de uma reportagem favorável a bingos
eletrônicos? Cadê a reportagem? Se alguém a encontrar, nunca mais escrevo uma
linha!
É bom botar essa
bola no chão. Jornalistas decentes só querem a verdade. E têm de ter claro que
há vigaristas querendo apenas as instituições — para
destruí-las.
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